A prática do Hatha Yoga que conhecemos hoje é o resultado de milhares de anos de evolução e síntese de conhecimentos, começando com os Vedas, passando pelo Vedanta, sendo codificado por Patanjali nos Yoga Sutras. Paralelamente, na filosofia hindu, a busca pela libertação espiritual, conhecida como Moksha, é uma jornada transcendental que vai além da existência física e da consciência do tempo, espaço e causa. Ambos os caminhos, embora distintos, apontam para a mesma direção: a busca pela iluminação e a conexão com o divino.
Moksa, na filosofia hindu, é a libertação do ciclo de renascimento e morte e a iluminação espiritual. É a transcendência da existência, de qualquer senso de consciência do tempo, espaço e causa (carma).
Os principais sistemas filosóficos do hinduísmo consideram que uma entidade viva, especialmente aquela que estiver utilizando um corpo humano, deve ter por objetivo alcançar três metas na vida: kama ou desfrute material dos sentidos; artha ou desenvolvimento econômico e dharma ou religiosidade mundana. Moksa é considerada como a meta que está além do trivarga, para aqueles que já estão liberados destas atividades mundanas que prendem as demais entidades vivas.
No entanto, a busca pelo Moksa não é apenas sobre a realização dessas metas, mas também sobre o desenvolvimento de virtudes. As virtudes são valores universais que transcendem as diferenças culturais e individuais, fornecendo diretrizes para a construção de um mundo mais justo e sustentável. Ao cultivar as virtudes, as pessoas desenvolvem uma compreensão mais profunda de si mesmas e do mundo ao seu redor, promovendo a consciência, a empatia e a compaixão.
Segundo os Yoga Sutras de Patanjali, um dos textos mais importantes do Yoga, a prática do Yoga é um caminho para alcançar a libertação (moksa). Patanjali propõe um sistema chamado Ashtanga Yoga, ou “Yoga de oito membros”, que serve como um guia para a prática do Yoga. A prática desses membros ajuda a purificar a mente e o corpo, permitindo ao praticante alcançar a iluminação ou moksa.
Na filosofia indiana, especificamente nos Vedas, o autodomínio é um conceito importante que é frequentemente associado à prática do Dharma, ou seja, o caminho correto. O autodomínio, ou “Dama” em sânscrito, é considerado uma das seis virtudes da realização do conhecimento espiritual, conhecidas como “Shatsampatti” no Vedanta. Dama refere-se ao controle dos sentidos, ou seja, a capacidade de restringir e controlar os desejos e impulsos sensoriais. Isso é visto como uma disciplina necessária para a purificação da mente e a realização do autoconhecimento, que são passos essenciais no caminho para a Moksa, ou libertação.
As seis virtudes de Shatsampatti, que são consideradas essenciais para treinar o praticante a superar a ilusão do mundo físico, são:
- Shama: Refere-se ao silêncio interior e à calma. Isso é alcançado quando retiramos a mente e os sentidos do tumulto do mundo externo e nos concentramos no eu interior.
- Dama: Significa autocontrole. Quando controlamos os sentidos, pensamentos e emoções com o intelecto (Buddhi), somos capazes de evitar ações mal consideradas e nos poupar dos problemas e sofrimentos resultantes.
- Shraddha: É a fé ou o reconhecimento do desconhecido.
- Titiksha: Refere-se à tolerância ou paciência, ou seja, não ser abalado pelo que ocorre.
- Uparati: É se alegrar ou estar com sua própria natureza.
- Samadhana: É a concentração da mente.
Essas virtudes são consideradas tesouros escondidos dentro de nós que nos ajudam a superar as influências dos Tritāpas e as barreiras de Mala, Vikshepa e Āvarana. Para descobri-las, é necessário uma observação cuidadosa de si mesmo e um treinamento da consciência. Tritapas, na filosofia indiana, refere-se às três forças do destino que influenciam nosso desenvolvimento desde o nascimento.
Essas forças são:
- Adhibhautika: São as várias perturbações do mundo externo que vêm da natureza ou de seres vivos. Isso inclui influências de calor, frio, ruído, fenômenos naturais como inundações, redemoinhos e terremotos, bem como ataques de animais selvagens, pessoas violentas, etc.
- Adhidaivika: São influências perturbadoras de forças e seres astrais. Por exemplo, essas podem ser a causa de acidentes repentinos, perturbações psíquicas, medos e depressão.
- Adhyātmika: São influências do plano vibracional dos Tattvas (os elementos). Entre outras coisas, essas são capazes de desencadear doenças físicas ou perturbações mentais.
Podemos diminuir as perturbações de Adhibhautika através de certas precauções, como paredes de proteção, fechaduras, parafusos, etc. No entanto, essas medidas são ineficazes contra as forças de Adhidaivika e Adhyātmika. Podemos nos proteger contra essas forças através de oração, mantra e Shatsampatti – os seis tesouros.
Os Vedas, que são os primeiros manuscritos conhecidos da humanidade, foram escritos há quase cinco mil anos atrás. Esses textos sagrados, gravados em folhas secas de palmeiras, são a base de todo o conhecimento e filosofias indianas, incluindo o yoga. Eles contêm os primeiros conhecimentos sobre ciências, espaço, aerodinâmica e tudo o que hoje entendemos como tecnologia. Naquela época, as pessoas estavam mais focadas na sobrevivência e na manutenção das castas. Cada pessoa tinha a oportunidade de explorar ao máximo o conhecimento disponível dentro de sua condição. Isso permitiu que uma riqueza de sabedoria fosse entalhada nessas folhas de palmeira.
O Vedanta, que significa a “conclusão” dos Vedas, é um dos seis sistemas da filosofia indiana. Ele se aplica aos Upanishads, que são elaborações dos Vedas, e à escola que surgiu do estudo dos Upanishads. O Vedanta é a interpretação final e a conclusão dos ensinamentos dos Vedas.
Patanjali, um sábio indiano que viveu entre o segundo e o quarto século a.C., é mais conhecido por compilar os Yoga Sutras, um conjunto de 196 aforismos que orientam a prática do yoga. Os Yoga Sutras de Patanjali são frequentemente referidos como a fundação da prática moderna do yoga.
O Hatha Yoga, que conhecemos hoje, é uma ramificação do yoga que usa técnicas físicas para tentar preservar e canalizar a força vital ou energia. Acredita-se que o Hatha Yoga tenha se originado por volta do século XI d.C., embora alguns yogis afirmem que ele foi originalmente desenvolvido por gurus iluminados para ajudar as pessoas a sobreviver durante a Kali Yuga, ou as idades espirituais sombrias. Que é exatamente a era em que estamos vivendo.
Assim percebemos que a prática do Hatha Yoga que conhecemos hoje é o resultado de milhares de anos de evolução e síntese de conhecimentos, começando com os Vedas, passando pelo Vedanta, sendo codificado por Patanjali nos Yoga Sutras, e continuando a se desenvolver e se adaptar até os tempos atuais. O yoga não é apenas filosofia, asana ou meditação, mas uma prática holística que busca harmonizar o corpo, a mente e o espírito, e nos conectar com o divino.