Fazer terapia é algo que vem sendo desmistificado ao longo das últimas décadas e, mais ainda, nos últimos anos, período em que a valorização da saúde mental como pilar fundamental da saúde integral do ser humano passou a ser ponto indiscutível. Poucos são aqueles que ainda têm dúvidas dos benefícios de cuidarmos da mente e das emoções, num contexto mais amplo de saúde.
E, sendo assim, quase todo mundo já tem uma ideia de como é “fazer terapia”: o paciente fala, o terapeuta escuta. Há terapeutas que falam um tanto também. Via de regra, ambos permanecem sentados durante o período da sessão, na qual acontecem turnos de fala e de escuta, permeados ou não de silêncios ou de manifestações emocionais. Mas, e nas psicoterapias corporais? O que acontece numa sessão de psicoterapia biodinâmica?
Não seria possível explicar num texto curto as múltiplas práticas utilizadas pelas diferentes abordagens das psicoterapias corporais, nem tampouco falar em nome de todos terapeutas biodinâmicos, mas posso contar um pouco de como acontecem as sessões comigo, para dar um exemplo prático e ajudar os interessados (e os curiosos!) a descobrirem se essa prática pode ser um caminho pra si.
Em geral, uma sessão comigo tem alguns momentos:
– Ouvir as palavras: costumeiramente, é assim que começamos. O paciente fala sobre sua dor, sua tristeza, seu medo, sua angústia, sua raiva. Fala sobre os fatos da vida que o fazem pensar o que pensa, sentir o que sente, viver o que vive. Eu escuto, profundamente, não apenas com os ouvidos, mas como todo o meu corpo. Falo apenas o necessário para compreender melhor o que está sendo dito. Há espaço para falar também sobre o prazer, a alegria, a conexão, o desejo. Nem todos os dias são de dor, há dias em que a potência se apresenta como tema e orienta o caminho da sessão.
– Ouvir o corpo: aos poucos, vamos incluindo o corpo do paciente nesse diálogo. Como as palavras que estão sendo ditas habitam esse corpo? Que partes do corpo sentem as sensações e as emoções que essas palavras trazem? Como o corpo manifesta a angústia ou o prazer que as palavras revelam?
– A busca de caminhos no corpo: há um momento em que o corpo do paciente busca caminhos para lidar com as sensações e emoções que se manifestam. Eu, como terapeuta, utilizo as práticas corporais da biodinâmica para ampliar o repertório dessa busca: autopercepções corporais, respirações, toques, relaxamentos, movimentos, visualizações, verbalizações. Essas práticas podem acontecer com a pessoa em pé, sentada ou deitada, a depender da prática escolhida e do fluxo criado pelo próprio corpo. Incluímos também o sutil, o que não pode ser visto nem tocado, mas que está no campo das intenções entre quem cuida e quem é cuidado. Em muitos encontros, faço uso de um estetoscópio eletrônico para ouvir as vísceras do paciente e aquilo que elas podem dizer sobre o que o que se passa no corpo. Os sons produzidos pelo corpo se tornam guias (ou mapas) que nos ajudam a navegar pelas águas profundas do ser que somos da pele pra dentro. Eu escuto e a pessoa se escuta, porque o estetoscópio eletrônico produz sons que ambos podemos escutar.
– A pausa: depois do fazer, experimentar o não fazer. Depois da busca, o descanso. A desistência. A entrega. O paciente pode experimentar esse silêncio interno, dessa ausência de um fazer, seja mental, corporal ou emocional. E experimentar apenas ser, em companhia.
– A integração: após o fazer e o não fazer, integrar as experiências vividas e sentidas no corpo às experiências vividas pela mente e pelas muitas dimensões de si. Integrar não é necessariamente “entender” os caminhos percorridos ou as buscas reveladas pelo processo. Muitas vezes, para integrar não são necessárias nem mesmo palavras, mas elas podem surgir e são sempre bem-vindas.
Tão importante quanto o esforço de explicar como geralmente acontecem as sessões é dizer que nem sempre elas seguirão esse fluxo. Existe uma intenção que pode ser (e muitas vezes é!) revolucionada. Há espaço para inverter a ordem, começando pela escuta do corpo (porque há dias em que ele chega gritando) ou pelo silêncio (porque há dias em que palavra nenhuma serve). Há espaço para a revolução e para criar o fluxo necessário e exato para o que tem que vir a ser, no agora.
Como eu costumo dizer sempre aos que me procuram: muito do que se passa na nossa vida e no nosso mundo interno não é da ordem da palavra. As palavras ajudam (e muito!), mas não dizem tudo. Há algo de nós que não cabe nas palavras. Minha clínica acolhe isso que não cabe. Acolhe isso que fica sempre faltando dizer. Acolhe isso que os ouvidos do mundo nem sempre estão disponíveis para escutar. Permite que o paciente escute a si próprio, para além das palavras que diz (e tanto disse) e das palavras que escuta (e tanto escutou).
O convite das sessões comigo é para o mergulho, dentro de si. Um mergulho que é, ao mesmo tempo, solitário e acompanhado. É saber-se só, mas não sozinho. E você, aceita o convite?
Vem mergulhar. Vem ouvir você.
Sabrina Sorci
Psicóloga e Psicoterapeuta